quarta-feira, 21 de julho de 2010

Bem-vinda, finitude


Talvez o primeiro e grande desafio de quem descobre uma doença grave seja o enfrentamento da finitude. Somos todos mortais, sabemos disso, mas não concebemos isso. Vivemos como se fôssemos imortais e como se tivéssemos todo o tempo do mundo para quem sabe um dia fazermos o que sempre quisemos fazer.

Mas, quando uma doença surge, essa onipotência é derrubada de maneira brutal. Somos então forçados a lembrar que não somos comandantes do nosso corpo e que, por razões diversas que na maioria das vezes fogem de nossa compreensão, ele pode tomar um rumo distinto do normal e desorganizar-se, gerando uma anomalia ou uma doença.

Ficamos perplexos. Lembramos que não temos mais tempo. Mas na verdade não temos nunca. A ilusão de que temos a tal "vida toda pela frente" é um mecanismo de defesa que todos usamos ao longo da vida para podermos suportar a certeza de que vamos deixar de existir um dia. E isso é demais para o nosso narcisismo conceber. Queremos ser sempre jovens, sempre lembrados. Imortais.

Por isso a doença muitas vezes pode ser considerada como algo importante, um acontecimento marcante que muda a nossa forma de perceber a vida e como optamos em vivê-la. Porque sim, temos opção sobre como vivemos a nossa vida. Podemos viver mais ou menos conscientes de nossa mortalidade. Mais ou menos conscientes de que precisamos estar perto das coisas que gostamos, de que precisamos estar mais próximos de quem somos, e descobrir isso, não importa a idade que se tenha. Há quem passe uma vida inteira sem jamais ter se conhecido de verdade. Há quem morra sem jamais ter vivido. Há quem viva tendo estado morto a vida inteira.

Você sabe quem é você? Você sabe como escolheu viver a vida?

Vá em frente e tenha coragem de responder a essa pergunta. Seja qual for a sua resposta, ainda há tempo. Porque sempre há tempo para renascer.

2 comentários:

  1. Não é apenas a doença que nos confronta com a nosso finitude, na verdade, é qualquer coisa que coloque em cheque esse nosso narcisismo, cada vez que a vida te diz não, cada vez que o desejo do outro é diferente do que esperamos, quando esse não vai de encontro ao nosso, e então temos que arriscar nos perder, perder o outro, ou aceitá-lo como ele é e aceitar que não podemos ter sempre tudo o que queremos se quisermos continuar tentando viver em busca da tal felicidade, que nunca é completa e incondicional. Boa sorte na tua nova casa! Beijão!

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  2. Objetivo alcançado com esmero, Luciane!

    Falou, direta e especificamente, sobre uma questão bem delicada que faz parte de sua rotina profissional e, eventualmente, de nosssas vidas: a descoberta de um diagnóstico.

    Ela, por si só, já dói. No paciente e nos que o amam...

    Um grande abraço,
    Doce de Lira

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